A Organização
Mundial da Saúde (OMS), em 2002, descreve perturbações mentais e
comportamentais como situações clinicamente significativas, que se caracterizam
por modificações do pensamento e do humor ou por comportamentos associados à
angústia pessoal e/ou agravamento do funcionamento. A mesma OMS define saúde
mental como o estado de bem-estar no qual realizamos as nossas actividades,
gerimos o stress do dia-a-dia, trabalhamos de forma produtiva e contribuímos
para a comunidade em que estamos inseridos. Assim, através da OMS, têm
sido criados nos últimos anos a nível europeu e mundial, documentos relevantes
para fortalecer uma visão holística da saúde mental, partindo do princípio de
que não existe Saúde sem Saúde Mental (Comissão
das Comunidades Europeias, 2005).
Ao falar-se de
doença mental grave surge como paradigma a esquizofrenia, a “loucura” da
psiquiatria clássica. Foi relativamente recente a mudança que ocorreu no
Ocidente, ao dar à loucura o estatuto de doença mental (Foucault, 2008). A
esquizofrenia afecta cerca de 1% da população e o destino destas pessoas, até
há poucos anos, era viverem em asilos ou hospícios por longos períodos de tempo
e muitas vezes o resto da vida (Alves, 2001; Oliveira & Filipe, 2009;
Pulice & Miccio, 2013). Na segunda metade do século XX ocorreu uma evolução
na forma como se encara esta doença mental por três principais factores: os
progressos da psicofarmacologia, a transformação do movimento dos direitos do
homem num fenómeno internacional, e a consciencialização de que a saúde mental
é uma componente da condição de saúde e bem-estar (Alves & Afonso, 2006).
A esquizofrenia
é uma das doenças do foro mental mais incapacitantes, não só para a pessoa em
si, mas também para as pessoas da sua rede de relações sociais e familiares.
Resulta numa grande alteração da personalidade, do pensamento, dos afectos e do
sentido da própria individualidade, levando a pessoa a confundir a fantasia com
a realidade e que geralmente conduz a modos de vida inadaptados e ao isolamento
social.
É uma
perturbação mental que apresenta múltiplas causas, embora sejam de destacar as
vulnerabilidades genéticas às quais se adicionam diversos factores de stress no
desencadear da doença. O aparecimento da esquizofrenia ocorre normalmente entre
os 16 e os 25 anos. O perfil do aparecimento da doença não é uniforme no que se
refere à altura do seu aparecimento nem à forma como se revela sendo que a
evolução da esquizofrenia pode ser caracterizada por dois estádios, súbito ou
lento. No estádio súbito, manifesta-se rapidamente e tem uma evolução em poucos
dias ou semanas, enquanto no estádio lento o diagnóstico precoce é muito mais
difícil e pode mesmo levar vários meses ou anos até que se detecte. No caso da
evolução lenta, a esquizofrenia no grupo dos jovens adultos pode mesmo ser
confundida com as chamadas crises de adolescência e por este motivo
frequentemente desvalorizada.
A sintomatologia que pode estar presente:
• Delírios, ideias delirantes (pensamentos irreais, como,
por exemplo, as ideias de ser perseguido ou vigiado)
• Alucinações (percepções irreais, ouvir, ver, saborear,
cheirar ou sentir algo irreal, como, por exemplo, vozes que mandam fazer alguma
coisa, ou comentam factos)
• Pensamento e discurso desorganizado (elaborar frases sem
sentido ou inventar palavras)
• Agitação,
ansiedade
• Falta de
vontade ou de iniciativa
• Isolamento
social
• Apatia
• Indiferença
emocional
Trata-se de uma
doença que apresenta várias possibilidades de tratamento, mas o farmacológico
juntamente com o psicológico facilitam numa maior adaptação, sendo que a maioria das pessoas que se tratam podem
levar uma vida praticamente sem limitações.
Os principais
objetivos que podem ser atingidos na psicoterapia de uma pessoa com diagnóstico
de esquizofrenia são: fornecer informações sobre a doença e procurar modos de
lidar com ela, restabelecer o contato com a realidade (a pessoa será capaz de
reconhecer experiências reais e diferenciá-las das alucinatórias ou
delirantes), identificar factores stressores e capacitar a pessoa a lidar com
os eventos da vida e discutir formas de suportar, modificar ou compreender
melhor as situações vividas. Assim, pode-se ter uma melhor evolução na doença,
com um crescimento, resultando num aumento da qualidade de vida e na adaptação
social, conquistando uma maior autonomia e independência e diminuindo o
isolamento. O sucesso do tratamento da esquizofrenia passa pelo envolvimento da
família e das pessoas próximas, de modo a que elas possam facilitar a adaptação
da pessoa em causa, à sua condição e para que todos possam aprender mais sobre
esta doença.
Diversas
investigações, em vários países, têm indicado que as pessoas
desinstitucionalizados, ao estarem inseridos na comunidade, demonstram uma
evolução positiva na aquisição e desenvolvimento de competências da vida diária
e na qualidade das interacções sociais, a nível global de funcionamento e na
qualidade de vida. Com um acompanhamento numa abordagem comunitária, a
autonomia e o desempenho geral dos pacientes podem ser melhorados (Bond e col.,
2004; Leff, 2000; Trieman, 2000; Vidal, Bandeira & Gontijo, 2008). Estudos
feitos pelo programa global da Associação Mundial de Psiquiatria para diminuir
o estigma e discriminação em relação à esquizofrenia (Leff, 2008), demonstraram
que o isolamento e afastamento das pessoas com doença mental do resto da
sociedade permite mais facilmente desencadear medos e fantasias sobre a loucura
por parte da sociedade (Link & Cullen, 1986; Phelan & Link, 2004).
Assim,
acaba por ser um dado consensual que um tratamento com abordagens integradas
para a pessoa com doença mental grave, que incluam procedimentos biológicos e
estratégias psicossociais focadas na pessoa e na família, são uma necessidade
(Gonçalves-Pereira, Xavier, Neves, Barahona-Correa & Fadden, 2006). É da integração
das possibilidades de intervenção existentes, que envolvem técnicos de saúde
(psiquiatras, enfermeiros, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes
sociais, etc.) e as diversas estruturas de suporte disponíveis (familiares,
sociais e comunitárias), que surgem as alternativas de tratamento acessíveis às
pessoas com esquizofrenia, nos contextos em que vivem (Campos, 2009).
Por decisão pessoal, a autora do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
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