terça-feira, 31 de março de 2020

Palavras Chave para a Crise Actual: Aceitação, Adaptação, Resiliência

Este momento crítico afecta-nos psicologicamente a todos, ninguém está imune. Afecta-nos de maneiras diferentes, não só pelas nossas funções (pessoas que trabalham cada dia têm preocupações e cuidados diferentes comparativamente aos que ficam todo o dia em casa, não menos nem mais fáceis, naturalmente diferentes), idades (crianças, jovens, adultos e idosos), condição profissional, etc. Apesar de haver preocupações mais específicas para cada grupo, existem questões transversais que nos podem facilitar ou dificultar em lidar com este momento totalmente novo.

Sabemos que algo que seja totalmente novo e inesperado, activa-nos, mas a forma como lidamos com essa activação vai fazer toda a diferença. E vai fazer a diferença no momento presente, mas também no nosso futuro, pós-pandemia. O Ser Humano tem a necessidade de segurança, e o controlo dá uma sensação de maior segurança. Se eu organizo os meus dias, as minhas rotinas, as minhas férias e dou pouco espaço ao imprevisto ou à espontaneidade, mais difícil é lidar com acontecimentos que estão fora do meu controlo. Sabemos que existem pessoas com maior necessidade de controlo e outras menos. Mas algo essencial numa situação como a que estamos a passar actualmente é ACEITAR. Aceitar o que está ao meu alcance e o que não está, aceitar que há incertezas sem respostas e procurar um estado da maior tranquilidade possível dentro dessa aceitação. O saber quando isto vai passar, o saber que nada nos vai acontecer... daria a todos nós um conforto e uma tranquilidade que neste momento não é possível. Então se não podemos saber, nem podemos controlar tantas coisas, como é ACEITAR que não temos esse controlo? Ninguém controla o mundo... Então como seria focarmo-nos no que está ao nosso alcance? Como seria focarmo-nos no que podemos fazer cada dia? Como é aceitar que apesar de ser difícil, e ter medo de ser infectado, faço tudo o que posso para me proteger? E agarro o que posso fazer, nesse controlo que posso ter, para me conseguir sentir um pouco mais tranquilo! Como é aceitar que apesar de estarmos pelos cabelos de estar em casa, sabemos que temos a possibilidade de decidir o que fazer, dentro de 4 paredes, mas para nosso bem! Como é aceitar as coisas que não podemos mudar, tal como elas são? 

Se por um lado há a palavra ACEITAÇÃO, pelo outro lado existe a RESISTÊNCIA. A resistência é o que nos agarra ao passado, aos dias que tínhamos antes e que queríamos ter agora, às certezas que tínhamos, aos planos, às rotinas conhecidas, às férias agendadas, à segurança que achávamos ter, ao conhecido. A RESISTÊNCIA é uma negação à necessidade de fazermos diferente agora, porque sabemos que é difícil, porque não sabemos como vai ser... Então resistimos! Não queremos! E queixamo-nos e criticamos e ficamos ali, naquele lugar pesado, onde só nos movemos quase arrastados, porque tem que ser. Lugar muito pesado esse, que apenas nos faz sentir desesperados, angustiados e perdidos.

A ACEITAÇÃO, apesar de não nos tirar o medo nem a preocupação, permite-nos procurar alternativas, e permite-nos ter controlo nas nossas pequenas coisas, permite-nos avançar adaptando-nos a uma situação nova e exigente. A capacidade de nos adaptarmos adequadamente a mudanças e situações inesperadas ajuda-nos a gerir a angústia e a incerteza. E é a essa capacidade de nos adaptarmos que chamamos de resiliência. E tomar medidas para desenvolvermos a resiliência é essencial, adoptá-las pode melhorar de uma forma geral o nosso bem-estar físico e emocional.

Para Promover a Resiliência…
- Faça uma pausa das notícias – veja apenas o mínimo necessário, no site da DGS, OMS e OPP.
- Aceite em agarrar o controlo das coisas que tem e não queira controlar o que não pode. Cuide de si e de quem está ao seu lado, alimente-se bem e hidrate-se.
- Aceite os seus medos e as suas emoções, exteriorize de uma forma saudável
- Não se isole, estamos todos no mesmo barco, fale com os seus amigos, colegas, familiares.
- Procure relaxar sempre que possível, com tarefas agradáveis de lazer, relaxamento ou actividade física.



Por decisão pessoal, a autora do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

terça-feira, 24 de março de 2020

As minhas emoções a mim pertencem




É com relativa facilidade que atribuímos a responsabilidade pelas nossas emoções aos outros. Se por um lado esta atribuição permite uma demissão da responsabilidade em relação ao que sentimos, por outro lado, traz consigo a perda de controlo e de comando sobre a nossa vida na medida que é ao outro que é dado o poder pelas nossas emoções e reações.
Ao afirmarmos “ Tu irritas-me com o que dizes/fazes”, estamos a funcionar a partir dessa lógica, numa procura de um culpado no mundo externo para as nossas emoções, perdendo assim a oportunidade de olharmos para nós mesmos.
Do mesmo modo, quando alguém próximo não se sente bem, facilmente também nos podemos sentir responsáveis e procurar a todo o custo resolver esse sofrimento, como se a solução para essa dor alheia estivesse nas nossas mãos. Assumirmos a responsabilidade pelas emoções dos outros poderá também gerar mal estar e culpabilidade e ser igualmente pouco eficaz, tal como é arranjar culpados para o que sentimos.
Um diferente posicionamento será afirmar “Eu é que me deixei irritar com aquilo que disseste/fizeste”. Nesta lógica está implícito que o próprio é o dono das suas emoções e sentimentos e como tal tem a capacidade de geri-los. Assim, em vez de tentarmos encontrar culpados, importa aumentarmos a consciência dos nossos sentimentos e reacções perante determinadas circunstâncias.
Claro que temos o direito e a legitimidade de manifestarmos o nosso desagrado ou desacordo e algumas emoções são mesmo inevitáveis em determinadas situações, mas a forma como as gerimos é da nossa responsabilidade e determinados sentimentos só vão perdurar se a nossa mente assim o ditar.
 Assumir o controlo do que sentimos é exatamente reconhecer e aprender a lidar com as emoções e não ser escravizado por elas, ou seja, não viver em reatividade às emoções mas gerindo-as com ponderação e bom senso.  A pessoa pode sentir-se alegre, triste, aborrecida ou irritada mas em controlo e em função dos acontecimentos da sua vida.
Este auto-conhecimento leva-nos a compreender que, apesar de não podermos mudar circunstâncias e as ações de terceiros, a forma como reagimos depende exclusivamente de nós e como tal podemos escolher, de entre infinitas possibilidades, a forma de nos relacionarmos com os acontecimentos da nossa vida.



Artigo publicado na Revista Psicologia na Atualidade, Psychology Now, nº 48 Jan-Fev-Mar 2020.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Não alimentar o medo, pela nossa Saúde Mental


Os acontecimentos do aparecimento do novo coronavírus e toda a evolução que teve desde então, criam muitos medos e preocupações. Medos e preocupações totalmente válidos, tendo em conta a situação verdadeiramente grave que estamos a passar. E percebermos que é grave, leva-nos a adoptar todas as medidas necessárias para nos protegermos, a nós e aos outros. E desta forma estamos a ser cidadãos conscientes e responsáveis.

No entanto esses medos e preocupações podem ser vividos de uma forma demasiado intensa, criando sintomas fortes de ansiedade. É essencial percebermos como nos podemos regular emocionalmente, sem que esses sintomas sejam exacerbados, de forma a prejudicar a nossa Saúde mental e global. Estar constantemente a pensar sobre o coronavírus pode causar o aparecimento ou o aumento de sintomas que podem provocar o sofrimento emocional.

Vamos por partes,
- Sim, sem dúvida que mantermo-nos informados é essencial, mas é importante conseguirmos perceber qual é a quantidade de informação necessária para este tema não nos absorver na totalidade. 1h por dia? O telejornal do almoço e da noite? 3 visitas ao site da DGS? Não há receitas... mas é importante estarmos conscientes de que viver o dia a dia constantemente em alerta só nos faz mal. A procura excessiva de informação é uma acção que nos dá uma sensação de controlo para acalmar o medo, mas paradoxalmente ele aumenta. Por outro lado, ver apenas os factos verdadeiros sobre a pandemia vai fazer com que não se fique alarmado por informações falsas que possam surgir nas redes sociais. É importante evitar informações que não provêm de fontes oficiais e confiar nas recomendações que são dadas pelo Governo e pelas entidades competentes, visto serem eles os que têm toda a informação da evolução do novo coronavírus, e seguir as medidas indicadas. Ao confiar nestes aspetos, vai-se reduzir as preocupações alarmistas que podem provocar pânico e ansiedade.

- A criação / manutenção de rotinas são importante! Sabemos que existem especificidades nas dificuldades de quem tem que ir trabalhar, nos que estão sozinhos em casa ou nos que estão com uma família numerosa em casa. Para os que não vão trabalhar e ficam em casa, a criação de uma rotina saudável ajuda a lidar com o isolamento, tal como ter um horário de acordar, o duche, o teletrabalho (ou o estudo), uma alimentação saudável, actividade física, e momentos de lazer (ouvir música, ler um livro, ver um filme, jogar, falar com amigos e familiares por telefone...). As pessoas necessitam de sentir controlo, e mudar rotinas de modo súbito e forçado causa uma sensação de ameaça, e tendo em conta que já se alteraram tantas rotinas e que vivemos num momento tão conturbado, que estas rotinas ajudam a manter-nos mais equilibrados, com objectivos e alguma organização. Para além de que actividades que nos obriguem a estar focados em outros temas, tal como o trabalho, o estudo, um filme ou um livro, permitem-nos ter momentos em que não estamos a pensar no que nos cria ansiedade e conseguimos assim diminuir o estado de alerta em que nos sentimos, e até mesmo relaxar, brincar e rir!

- A Actividade Física - é uma maneira de cuidar da saúde e ocupar a mente durante o período de isolamento social, para além de melhorar a qualidade do sono, reduzir o stress e aumentar a sensação de bem-estar. Existem inúmeros sites com orientações de exercícios, vídeos e aulas online (para todos os gostos!) para essa actividade poder ser realizada.

- Estar em contacto com as nossas emoções, reconhecê-las e aceitá-las com naturalidade, permite procurarmos formas de as expressar, não ficando presas em nós, criando mal-estar. Podemos partilhar com alguém próximo (manter o contacto com a família e amigos através dos meios disponíveis faz-nos sentir que não estamos tão sós) e/ou procurar uma forma de nos expressar emocionalmente – há quem use um diário ou a escrita, o desenho, a música ou a dança.

Quando somos confrontados com situações inesperadas, tal como esta em que estamos a viver actualmente, surgem alterações em nós próprios e vamos precisar de integrar o que está a acontecer. Quanto maior a nossa consciência sobre o que estamos a sentir, mais facilmente procuramos formas de nos regular emocionalmente e de nos adaptarmos, para vivermos o dia a dia, da melhor maneira dentro do possível.



Por decisão pessoal, a autora do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.