Quantas vezes já nos
detivémos a tentar responder à questão “O que é que eu realmente quero?”? “Ser
feliz” e/ou “ser saudável” poderão ser hipóteses integradas na resposta, mas
são afirmações que, por si só, são demasiado vagas, e em que nos envolvemos pouco...
quase como se fossem um lugar para onde basta apanhar um avião, desfazer as
malas à chegada e permanecer.
Como é que por vezes
essa ideia de alcançar felicidade, que nos parece aquilo que mais queremos,
pode deixar-nos, ao mesmo tempo, tão desiludidos e mesmo aterrorizados? Em
parte, porque muitas vezes preferimos escolher, mesmo que seja difícil, o que
nos é familiar (e por isso confortável) do que o que nos é estranhamente gratificante
ou bom.
Muitos de nós crescemos
a ouvir a ladaínha do “serei feliz quando...” (“passares de ano”, “nos mudarmos
para uma casa maior”, “formos de férias”, etc.), e rapidamente cada um de nós
aprende também que será “feliz quando”: “for para escola”, “me derem
presentes”, “deixar a escola”, “arranjar um bom emprego”, “casar”, “tiver
filhos”, ou mesmo “me divorciar”... a
perspectiva é de que aí, quando o futuro chegar, seremos finalmente felizes.
Este esforço constante por alcançarmos as "coisas" da vida que
acreditamos que irão trazer-nos felicidade por vezes parece dominar-nos e
afastar-nos da ideia de que a felicidade, a alegria, o prazer, as “coisas” boas
da vida existem e acontecem... agora!
Não surtirá grande
(algum?) efeito esperarmos que cheguem esses momentos, até porque poderá surgir
a sensação de que não era aquilo que esperávamos, que, afinal, não fomos
inundados por uma enorme satisfação, prazer e plenitude.
Procurar alcançar aquilo
que se deseja pode ser sentido como insuportavelmente arriscado: é como se o
desconhecido nos colocasse à mercê do destino, da esperança, daquilo que não
podemos controlar, e, consequentemente, à possibilidade de perda. Ao não
tentarmos, ao boicotarmos os nossos próprios planos, apesar de quase
inevitavelmente nos podermos sentir tristes por não alcançarmos o que
ambicionamos, ficamos simultaneamente mais tranquilos e com uma maior sensação
de segurança e controlo. Isso faz com que, de alguma forma, nos seja possível
dizer “Está tudo bem”. Dizemo-lo aos outros (para não os preocupar, por
exemplo), mas tentamos dizê-lo também a nós próprios porque assim não temos que
mudar nada na nossa vida, não precisamos de nos esforçar... porque “Está tudo
bem”! Na verdade, não está. Sabemos no nosso interior que desistimos daquilo
que tanto desejamos, por sentirmos que exigia um risco demasiado grande para o
nosso conforto presente. Contudo, há uma coisa que é importante termos em conta
nesta situação: nunca nos vai parecer (nem aparecer) o momento certo!
Ao nos questionarmos
acerca daquilo que pretendemos alcançar, importa procurar respostas mais
operacionalizáveis, e que nos comprometam a nós mesmos (e não a divindades,
genética, sorte ou acasos) na sua concretização.
Por vezes, o caminho
pode passar por nos “forçarmos” a fazer as coisas. Não acredito em receitas
rápidas, em qualquer coisa que possamos arranjar que nos dê uma “vida boa” e a
mantenha dessa forma. A vida por vezes pode parecer-nos confusa, complicada, e
lidar com as suas exigências irá requerer da nossa parte dedicação, esforço,
empenho, e, até mesmo, algum sofrimento. Mas, como disse Pessoa:
...
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
(Fernando Pessoa, in “Mar Português”)
Ana Luísa Oliveira escreve de acordo com a antiga ortografia.
Sem comentários:
Enviar um comentário