sexta-feira, 6 de maio de 2016

Jean-Paul Sartre... e a Clareza para Escolher

Aprendemos com Sartre que as coisas não têm que ser como são. Procuro trazer para terapia esta noção de liberdade, de oportunidade, de escolha... esta verdade de que somos muito mais livres do que nos permitimos imaginar perante todos os compromisso, regras, preconceitos e obrigações. Parece-nos impossível acreditarmos que quase tudo nos é possível e permitido.
Isto não significa (como ouvimos em muitos sítios) que “basta querer”. Onde pretendo chegar é que muito daquilo que muitas vezes vivenciamos como obrigações, imposições, ou mesmo o nosso (tão português) fado, são, na verdade, escolhas.
Não são poucas as vezes que ouvimos um amigo ou alguém na rua lamentar-se de que está “preso” num emprego que detesta, ou numa relação sem crescimento. Acredito que se sintam sem alternativa, mas quão presas estarão, efectivamente, estas pessoas? A possibilidade de mudar está-lhes realmente vedada? Não há nada que possam fazer relativamente ao emprego que odeiam ou à relação que estagnou? O que as impede de se despedirem, mudarem de país, reiventarem-se como pessoas completamente diferentes, ou saírem de casa, terminarem a relação que tinham?
Em poucos segundos, conseguimos encontrar um sem número de razões por que tal não seria apropriado, viável, ou mesmo possível. E é aqui que recordo novamente Sartre – o seu desejo de nos dar acesso a um modo de pensar diferente, de libertar a nossa imaginação.
Frequentemente acontece não nos apercebermos da imensidão de escolhas que temos ao nosso alcance, mas outras vezes parecemos não estar dispostos a pagar o valor que essas escolhas acarretam... e isso, é uma escolha por si só. De forma a concretizarmos plenamente a nossa liberdade, chegamos ao conceito Sartriano de “angústia” da existência, em que tudo é (assustadoramente) possível porque nada tem um sentido ou propósito pré-determinado, ou determinado por Deus, e que defende que os seres humanos se vão inventando à medida que avançam e são livres para abandonar as amarras a qualquer momento. É natural que possa parecer assustador... o termo “angústia” não terá surgido por mero acaso. Mas para Sartre, a angústia era um sinal de maturidade, um sinal de que estamos plenamente vivos e devidamente conscientes da realidade, com a sua liberdade, suas possibilidades e suas escolhas de peso.
Não me parece possível escolhermos de forma livre sem auto-conhecimento. Mas, infelizmente, a vida quotidiana parece recompensar as perspectivas mais práticas, não introspectivas, de auto-justificação, que em nada facilitam esse estado de maior consciência acerca de nós próprios. Por outro lado, a psicoterapia, o desenvolvimento pessoal, ou até mesmo os momentos em que nos arriscamos a ficar a sós connosco próprios, possibilitam-nos o privilégio de acedermos à nossa “mente superior”, ou neocórtex, a sede da imaginação, empatia e julgamento imparcial, o lugar onde as escolhas podem ser feitas de forma mais livre e genuína.



Ana Luísa Oliveira escreve de acordo com a antiga ortografia.

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