Desde pequeninos
que ouvimos perguntas como “O que queres ser
quando cresceres?”. Não só este ser
(e não fazer) se refere à profissão
que pretendemos escolher (como se isso se tornasse no nosso “eu” ou o nosso
“eu” passasse a ser, simplesmente, o trabalho que desempenhamos), como parece
haver uma certa urgência na decisão (como se não pudéssemos, simplesmente,
ainda não saber). Isto devia alertar-nos já em crianças para o que nos espera
em adultos…
A experiência e a
investigação mostram-nos que uma das coisas que mais contribui para o
desenvolvimento da nossa identidade em adultos é a nossa profissão. Mais uma
vez, parece que os conceitos de ser e
fazer se tocam. Não é só o nosso “eu”
social que parece depender da nossa profissão, mas também o nosso “eu” individual
é construído em parte por ela.
Em tempos em que
tantas pessoas se encontram desempregadas, e tantas outras (ou mais ainda)
estão insatisfeitas com aquilo que fazem, com os cargos que ocupam, como se
definem os adultos de hoje? Como podem eles (re)construir as suas identidades?
Mesmo quando a
nossa resiliência nos permite ver o desemprego como uma oportunidade (ou que
somos livres de mudar), e perceber que temos um mundo de possibilidades de
escolha, muitas vezes, o que acontece é ficarmos paralisados - ficamos tão
ansiosos com o receio de fazermos a escolha errada, que acabamos por não fazer
escolha nenhuma. Isto não significa que não tenhamos preferências, ou que não
há nada que gostássemos de fazer, mas apenas que não sabemos com clareza o que
é (o que nos coloca na perigosa posição de quem não tem um plano: facilmente
fica à mercê de quem tem um).
Quando iniciamos a
pesquisa da profissão que queremos seguir, aquela que nos vai “encher as
medidas”, o primeiro passo passa por nos conhecermos profundamente. Para isso,
precisamos de não pensar em dinheiro por alguns momentos, uma vez que a
ansiedade com as contas e a subsistência podem comprometer qualquer diálogo com
o lado mais autêntico e entusiástico de uma pessoa. Assim, da forma mais
espontânea e intuitiva que lhe for possível, escreva TUDO aquilo que alguma vez
tenha gostado de fazer (o que pode incluir fazer queda livre, separar as roupas
por cores no armário, ou organizar um divertido jantar para os amigos). Às
vezes, quanto mais estranha e excêntrica lhe parecer a lista melhor, porque é
muito provável que nesta confusão de ideias estará o esboço da sua identidade
profissional.
Claro que esse
esboço é ainda muito desordenado, e por isso requer uma análise mais profunda,
que pode demorar vários meses de constantes reflexões diárias até se poder
identificar uma profissão que seja adequada à sua identidade. Contudo, tendemos
a sentir-nos ansiosos acerca disso, culpando-nos muitas vezes de
auto-complacência… Mas na realidade, se não queremos passar o resto das nossas
vidas presos ao trabalho que “um miúdo” de quem já mal nos lembramos escolheu
para nós quando tinha 16 anos, precisamos ser generosos connosco quanto ao
tempo que vamos dispensar com isto.
No entanto, só nos
conseguimos conhecer verdadeiramente se formos ao encontro do mundo real, e não
nos limitarmos a reflectir acerca da nossa identidade e do nosso futuro.
Precisamos reunir informação mais concreta, seja através de um estágio ou
voluntariado, de observação, ou até mesmo ouvindo os outros. Para isso, e
porque por vezes o conhecimento dos outros acerca de nós pode estar mais
“apurado” em algumas áreas do que o nosso próprio, podemos, por exemplo, pedir
a alguns amigos e a outros tantos colegas ou ex-colegas de trabalho para nos
dizerem três qualidades nossas. Isto poderá ajudar-nos a (re)descobrir em nós
características para as quais não estávamos sensibilizados.
Esta descoberta
poderá ser crucial para outro importante passo na procura da sua profissão: ser
confiante. Por vezes parece absurdo, mas de uma forma estranha e também ela por
vezes absurda, a diferença entre sucesso e insucesso reside, com frequência, na
coragem em arriscar. Neste campo, a falta de confiança corresponde, não raras
vezes, a uma compreensão deturpada de como o mundo funciona, em que supõe que apenas
algumas pessoas (mas nunca nós próprios) têm o direito pré-determinado de obter
determinadas coisas… Quando, na verdade, conseguimos fazer muito mais do que
aquilo em que acreditamos nos nossos momentos de dúvida e timidez. Estas são algumas estratégias que nos podem ajudar a
chegar mais perto da nossa identidade profissional, e a redefinir o nosso
caminho. A psicoterapia pode ser uma importante ferramenta neste processo de
auto-conhecimento.
Ana Luísa Oliveira escreve de acordo com a antiga ortografia.
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