... Porque
amanhã quem sabe se vais cá estar
Ai tu bem
sabes como a vida foge
Mesmo que
penses que está p'ra durar
(António Variações, in É p'ra amanhã))
Já escrevi antes sobre Procrastinação,
sobre Desprocrastinar... como lidar com esse adiar não
produtivo a que por vezes nos entregamos, o protelar das tarefas mais ou menos
triviais que vai ganhando espaço nas nossas vidas, roubando-nos tempo e
experiências.
Na letra de É
pr'amanhã, António Variações parece falar também de procrastinação (É
p'ra amanhã/ Bem podias fazer hoje/ Porque amanhã/ Sei que voltas a adiar),
destacando o impacto negativo que esta pode ter na vida do procrastinador
(Quando pensares/ No tempo que perdeste/ Então tu queres/ Mas é tarde demais), e na urgência
de viver no agora (É p'ra amanha/ Bem podias viver hoje/ Porque amanhã/ Quem
sabe se vais cá estar). Mais do que isso, Variações parece ir além do
simples adiar de objectivos e obrigações, e antes falar de sonhos, vontades,
desejos desperdiçados ao tempo, de projectos, decisões, vidas, que ficam por
(se) cumprir.
Mas, então, por que adiamos o que desejamos? O que nos
impede de tentar cumprir o que escolhemos? O que fazemos aos nossos sonhos?
Eu sei que tu
Andas a procurar
Esse lugar
Que acerte bem contigo
Do que aparece
Tu não consegues gostar
E do que gostas
Já está preenchido
Estaremos a arranjar “desculpas” para não avançar?
Porquê? Para quem? Quando e se a vida é nossa, e a escolha foi feita por
nós...?!?
Há, por vezes, momentos nas nossas vidas em que, depois
da dificuldade em escolher o destino, em olhar com clareza o horizonte, e já
com uma noção do caminho por onde queremos ir... não vamos. Ficamos.
Permanecemos. Não avançamos, mas também não abandonamos o caminho. É como ficar
à porta de casa com a mala feita e os bilhetes da viagem na mão. Não vamos, mas
também não deixamos de ir.
À medida que o tempo passa, ficamos cada vez mais e mais
desconfortáveis nessa posição, e ainda mais por não avançarmos para onde
queremos ir. E esse desconforto, a dúvida acerca do motivo, pesa-nos,
sobrecarrega-nos, parece fazer-nos sentir que é ainda mais difícil partir...
Por vezes tomamos decisões sem que a emoção e a razão
sejam integralmente consideradas (nem tem que assim ser). Contudo, estes são os
momentos em que, racionalmente, a decisão que tomámos parece considerar e
responder todos os critérios que estipulámos, mas, emocionalmente, não nos
sentimos seguros em avançar, as nossas emoções não parecem agradadas com aquilo
que a nossa razão escolheu. A mente decidiu, mas o corpo não avança. Procurar
alcançar aquilo que se deseja pode ser sentido como insuportavelmente
arriscado, como se o desconhecido nos colocasse à mercê do destino, da
esperança, do que não podemos controlar, e mesmo da possibilidade de perda. E
vem a ansiedade, a tristeza, o medo do que aí vem e que nos paralisa.
Deixemo-los entrar. Aceitemos que podem ser sinais importantes do nosso
caminho. Sinais que podem ajudar-nos a perceber, por exemplo, que estamos a
tentar caminhar para onde deveríamos ir, e não para onde queremos genuinamente chegar.
Ana Luísa Oliveira escreve de acordo com a antiga ortografia.
Sem comentários:
Enviar um comentário