sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Morte e Leveza podem não ser incompatíveis - A importância da Psicologia nos Cuidados Paliativos

 A morte na nossa sociedade é um tema que as pessoas evitam falar. Apesar de ser a única certeza que se tem na vida, que esta é finita, o medo, o receio e a angústia que estão associados ao pensar-se nisso, faz com que a morte seja um tema tabu. Contudo o não se falar da morte como algo natural, quando as pessoas se vêm obrigadas a lidar com ela, seja porque lhes é diagnosticada uma doença grave, ou porque um ente próximo morre ou lhe é diagnosticado uma doença grave, e/ou terminal, torna muitas vezes essa vivência mais penosa, pesada e sofrida.

A morte é um processo natural, porém doloroso, mas desmistificar o tema e alertar que, é preciso aceitar a morte para ter qualidade de vida, acaba por ser importante para melhorar a qualidade de vida, quando esta está a terminar.

Quando a pessoa doente sabe que tem pouco tempo de vida, é importante permitir-se a fazer o luto de todas as suas relações e acima de tudo, fazer o luto de si própria. No entanto o doente terminal tende a passar pelas diversas fases de luto (negação, revolta, negociação, depressão e aceitação). Alguns doentes sabem da sua situação, mas fingem não saber ou não compreender, tal como os próprios familiares, isso exatamente pela dificuldade de se olhar para a finitude de vida e de se falar sobre o tema.

Ao viver-se numa situação de doença grave, ameaçadora de vida, com carácter progressivo, esperar que o desenrolar da doença não corresponda ao que se conhece, ou ao previsto para aquela situação, pode levar a decisões que aumentam o sofrimento ou que impeçam a resolução de questões importantes para o doente e para a sua família, nomeadamente o despedir-se das pessoas que lhe são importantes. O luto antecipado pela família por vezes torna-se tão difícil que dificulta o próprio doente a fazer o luto de si próprio e a encontrar tranquilidade, paz e aceitação. Muitas vezes a negação da família prejudica o próprio doente a vivenciar o seu processo, prendendo-o à tristeza, revolta e angústia que a família sente. O contributo dos psicólogos neste acontecimento de vida é crucial, facilitando a regulação emocional e alívio do sofrimento e na construção de significado.

São vários os estudos que demonstram que, a seguir à dor descontrolada, a má comunicação é o que mais sofrimento causa a estes doentes. Facilitar a comunicação e a partilha dos sentimentos é algo fundamental, validar e dar significado à raiva, frustração, desespero, desorientação, culpa, deceção vai permitir encontrar uma tranquilidade e paz.

O trabalho de luto com o doente e com a família é um processo difícil, mas ao valorizar-se a dignidade da pessoa ainda que doente, vulnerável e limitada, e facilitando o processo de aceitação da morte como uma etapa natural da vida, vai permitir que o doente viva o resto da sua vida, de forma mais leve e com melhor qualidade de vida.

Este cuidado humano, faz parte dos cuidados paliativos, que constituem hoje uma resposta integrada e indispensável aos problemas do final da vida. Em nome da ética, da dignidade e do bem-estar de cada Pessoa é preciso torná-los cada vez mais presentes na nossa sociedade.


Artigo publicado na Revista Psicologia na Actualidade - Psychology Now, nº 54 Julho/Agosto/Setembro 2021

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