A
coerência associada à previsibilidade e à constância dos cuidados maternos é
uma condição que desde cedo se coloca como fundamental para o desenvolvimento
psico-emocional da criança. Uma vinculação segura só é possível se a criança
usufruir de uma experiência de confiabilidade, a partir da qual pode
depender da resposta ajustada da mãe às suas necessidades, o que lhe vai
promover a segurança necessária para explorar o mundo ao seu redor.
Ao
longo da vida a perceção de coerência também é fundamental para o
desenvolvimento das relações entre as pessoas, isto é, a segurança de se saber
com o que se pode contar da parte do outro.
A
perceção de falta de concordância entre o que é dito e os comportamentos
adotados, levam muitas vezes a uma falência da credibilidade e da
confiabilidade, com prejuízo para a relação. Um exemplo disso é o caso de
pessoas que dizem gostar de outras e serem suas amigas mas nunca estão
disponíveis para falar, ouvir, prestar suporte, estar presente ou cumprir
com o combinado, pois existem sempre outras prioridades. Outros exemplos são as
pessoas que defendem valores como solidariedade e generosidade mas que depois
vivem de uma forma completamente egocêntrica ou situações de incoerência na
educação parental quando por exemplo um pai ensina ao filho que deve pedir
licença para se levantar da mesa mas ele próprio não o faz.
Lidar
com alguém que transmite mensagens antagónicas, quer entre palavras e
comportamentos, ou entre linguagem verbal e não verbal, é gerador de
desconforto, podendo levar a um estado de alerta, que tornando-se constante,
gera stress e ansiedade.
Se
em certas situações esta incoerência é consciente por parte do seu
protagonista, outras vezes há em que o próprio nem sequer reconhece os
sentimentos antagónicos que lhe estão a causar desconforto e incoerência nele
próprio e consequentemente nos outros.
Por
exemplo, mediante uma escolha afetiva relacionada com o ir ou não ir viver
maritalmente com alguém, a pessoa em questão afirma que deseja essa união mas
adia-a sistematicamente, alegando as mais diversas justificações para tal,
porque na realidade está a evitar reconhecer e lidar com eventuais
sentimentos contraditórios.
A
disponibilidade para “ouvir” com sinceridade o que cada uma das partes internas
do conflito tem para nos dizer é fundamental, só assim é possível reconhecermos
e compreendermos as razões do “sim” e as do “não” e colocá-las a dialogar uma
com a outra para chegarem a acordos.
O
não permitir esta escuta interna para evitar o desconforto de lidar com
sentimentos antagónicos, acaba por se traduzir em reações de incoerência
geradores de sofrimento não só para o próprio mas também para o outro.
Artigo publicado na Revista Psicologia da Atualidade, Psychology Now, n.º43 Out-Nov-Dez 2018
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